Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.
As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.
O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.
O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.
Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus,
se sabias que eu era fraco.
Mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.
Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.
Dá para entrever Drummond, no que se refere ao momento histórico em que se situa o Poema de Sete Faces, como um poeta conflituado com o mundo, buscando na própria dialética existencial a explicação do sem-sentido da vida. Seu drama começa ao ser lançado nos adversidades do mundo sob as ordens de um “anjo torto”: anjo que representa as desarmonias entre o poeta gauche e o mundo.
O poeta se via como “gauche”, “torto”, “canhestro”, em face de si e do mundo, ele não consegue se situar em um contexto social. O seu referencial é o seu próprio eu insatisfeito, buscando, desejando, retraindo-se. Por isso ele cobra: “Meu Deus, por que me abandonaste/ se sabias que não era Deus/ se sabias que era fraco”. Ele é esquecido por Deus e termina o poema “comovido como o Diabo”, depois de beber e de relembrar sua triste realidade.Mostrando a desesperança, e o vazia que as Filosofias materialistas e hedonistas deixam no espírito humano, por não trazerem a verdadeira felicidade e não responderem as questões existenciais humanas, deixando esse homem perdido e confuso.Tornando suas últimas reflexões vltadas para Deus, como última esperança de consolação.
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